domingo, 14 de setembro de 2014

SEGREDOS

            Deu alguns passos e o observava atentamente, furtivo, calado, desviando o olhar para que não fosse notado. Engolia a seco toda vez que o fitava, o coração palpitava, quase saindo pela boca. Aquilo era difícil, entender aquelas sentimentalidades tão obscuras, tão obscenas, tão fortes e destrutivas. Se fosse encarado agora, ele choraria:

            — O que você está olhando? — simples, seco e direto. — Perdeu alguma coisa?

            — Não, nada... — respondeu olhando para o outro lado.

            Sentia-se constrangido, queria morrer, queria que um buraco se abrisse na sua frente e pudesse fugir por ele. Estaria tudo acabado se fosse descoberto, o que ele faria? No fundo, queria poder dizer, falar abertamente e dizer para o mundo todo o que realmente queria. Esperou mais alguns segundos, tornou a olhar... ele ainda estava voltado para ele:

            — Diga logo, quer um barato? São dez contos.

            — N-Não... — continuou andando, como se apenas tivesse errado o olhar.

            Os próximos metros de sua caminhada seriam penosos, a profusão de seus pensamentos o atordoava, turvava sua visão, suas pernas tremiam. Quase cambaleando, dava um passo de cada vez, duros, erradios. Chegou ao limite da calçada e parou para olhar para os lados. Travou ao ver que ele o seguia. Desnorteado, deu um passo em falso na rua. Um carro estava vindo.

            — Ei! O que há com você? ’Tá chapado?

            Bruscamente ele o puxara, o movimento fora tão súbito e imprevisível que, ao se ver em seus braços, suas pernas fraquejaram e foi ao chão, levando ele junto:

            — Diabos! Você é doente ou o quê?!

            Aquele momento era especial, os dois estavam se olhando diretamente. Enrubescido, baixou a cabeça e respirou fundo.

            — O que está esperando? Saia de cima de... — um estampido o interrompeu.

            Levantou-se sem maiores problemas, via o olhar atônito dele sem entender o que estava acontecendo e sorrira abertamente. O farol abrira e atravessou para o outro lado, deixando-o para trás, caído, com uma mancha vermelho se formando em sua barriga.

           A frente, notou que estava sozinho, tirou a arma com silenciador do bolso e encostou-lhe os lábios delicadamente, como num beijo:

            — Eu te amo... — continuou andando, a satisfação era plena, nunca se sentira tão vivo.

            O outro, que ficara na calçada, em seus últimos instantes pensara: “Achei que fosse um cara legal...”

...

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