Eu não tenho sorte...
Definitivamente eu não tenho sorte...
Quando finalmente eu queria estar aqui por um bom motivo
alguma entidade vinda sei lá de onde decidiu fazer meu pai finalmente mudar de
ideia...
Sim, acabou, não mais irei morar em Pereiro, no Ceará! Assim
que o carro for vendido, faremos as malas de alguma forma, sem levar tudo o que
trouxemos, minha mãe e eu voltaremos para São Paulo, capital. Digo apenas ela e
eu pois meu pai já passa a maior parte do tempo lá, tentando ganhar algum
dinheiro.
Mas, isso não era o que eu queria?
No momento, não, era o pior momento para isso acontecer. Eu
estou tentando escrever um livro, preciso de paz interior para me concentrar e
ela agora está novamente abalada. Passei aqui os piores momentos da minha vida,
passei por momentos ruins antes de vir pra cá e agora terei de passar por todo
o processo destrutivo que se chama mudança de novo!
O que eu quero, se isso alguma vez foi importante, foi ser
feliz com o que eu estou fazendo. Eu já havia desistido de ter esperança nas
pessoas, no lugar, nos animais e nas coisas, mas ainda restava um pouco de fé
em mim, afinal, eu gosto de escrever em demasia, isso me agrada.
Agora, com a mudança, não sobrará mais nada de mim, da minha
perspectiva sobre a vida... Tudo se resume a autodestruição, só há vida para
ter morte. Sou bastante pessimista, não acha? Afinal, o que a vida mostrou de
bom pra mim? Que o dinheiro é sempre o mais importante e se você não o tem,
acaba se tornando pessimista como eu...
O que mais dói dessa vez é que terei de abandonar meus
gatinhos... Mesmo que desse para levá-los, São Paulo não é um lugar
interessante para gatos, eles podem pegar doenças, brigar com outros gatos, se
machucar ou ser machucado por outras pessoas e, pra completar a cereja do bolo,
não dá pra deixar o gato simplesmente preso dentro de casa. Eles precisam de
espaço e liberdade, eu não posso dar isso a eles. Quem sabe assim eu perco de
vez as esperanças e paro de acreditar que é possível ser feliz, isso é coisa de
trouxa... Desculpe se minhas palavras incomodam a sua perspectiva de vida de
alguma forma, eu tenho que esquecer o passado, acreditar que eu não preciso mais
dele, que eu tenho que seguir em frente, deixando de ser quem eu era e ser um
arremedo de gente que não sabe mais o que pode ser bom em sua vida – tudo falhou,
tudo falhará...
Há internet na minha casa lá em São Paulo (que de minha não
tenho nada, a não ser que eu a compre), mas vou perder completamente a
autonomia, terei de dividi-la com meus irmãos novamente e possivelmente irei
abandonar tudo o que eu já quis fazer com a internet um dia.
Tanta coisa aconteceu, tanta gente ficou para trás e eu
ainda estou chorando...
A pior parte é que isso não passa de mais um golpe que a
vida me dá, não há nenhum futuro me esperando, apenas sacrifícios, um atrás do
outro. Como se alguma hora isso fosse melhorar, não é?! Todas às vezes eu tento
deixar de relevar a desgraça que é a minha vida, na esperança de que amanhã a
dor passe... mas ela sempre volta! Ah! Como volta!
Irei sempre me lembrar da minha grande decepção que tive
aqui, como eu adorava aquela história, aqueles livros, de como me dediquei a
ela durante cerca de um ano como escritor e mais tempo como fã, e terminando
por me decepcionar amargamente e irremediavelmente. Eu odeio você, você tornou
esse momento excruciante da minha vida ainda pior, aumentou meu rancor e minha
desgraça. Eu sou apenas um trouxa, não é isso? Sou apenas mais um, um ser
irrelevante que vai ser obrigado a viver a vida com amargura, odiando a si
mesmo pelo resto da vida.
Eu finalmente estava calmo, calmo o suficiente para
perceber: “Ei! Por que eu não posso tentar isso?”, e a vida, irrequieta com a
minha pouquíssima felicidade, decidiu que definitivamente tudo havia dado
errado de vez e que eu iria perder o juízo, me transformando num ser que deseja
a própria morte.
Hah... Hahah... Eu já ia me esquecendo! Eu aprendi a dirigir
aqui! Eu sou mesmo um grande piadista, não sou?! Sou mesmo! Não percebeu a
ironia? Deixe-me explicar-lhe então, eu não tenho como tirar carteira de
motorista nem como comprar um carro novo! Hahahaha... Não é legal?!
Onde a minha vida vai parar...
Deus, eu queria acreditar em você agora, poder crer que um
dia isso irá acabar...
Não dá...
Em Janeiro faço 24 anos, e não sei o que fazer, tudo o que
eu aprendi, TODAS as coisas de que gostei, se tornaram perda de tempo agora. Se
elas não podem me fazer feliz, talvez eu devesse recusar o seu presente generoso
que foi a minha vida...
Hahahah...
Não há como amar a Deus tendo ódio no coração...
E quando essa lágrimas que molham meu rosto secarem, só
haverá ódio dentro de mim...
Seria possível que finalmente meu milagre iria acontecer?
Será? Será? Será?
Argh! Como vou conseguir terminar o meu livro assim?!
Talvez eu devesse dar um spoiler aqui e dizer que todos os
personagens serão cruelmente massacrados...
Talvez eu devesse rir de mim mesmo sem parar e alegar
insanidade mental...
Talvez eu devesse parar de escrever... para sempre!
Será que algum dia eu vou pelo menos ter coragem de sair de
casa novamente? Eu não faço mais ideia de como eu poderia me virar em São
Paulo... Quem sabe eu deveria começar pelo mais difícil, mendigando pelas ruas,
com um cartaz dizendo: “Minha vida foi arruinada e não sei mais o que fazer,
poderia me dar uma moeda para que eu possa comprar um livro velho?”
Quem eu estou querendo enganar?! É decepcionante ler
livros... De todas as pessoas no mundo que poderia se decepcionar com a
literatura, a que menos tinha chances acertou na loteria!
Uma vez eu comentei que, após algumas sérias mudanças na
minha antiga casa, quando eu voltasse a São Paulo a ficha finalmente iria cair,
eu finalmente me daria conta de que não tenho mais um lar. Provavelmente eu estou
apenas sendo uma pessoa histérica que está com medo de começar de novo... Quisera
eu fosse simples assim! Eu simplesmente não tenho mais motivos para acordar
pela manhã, tudo onde eu me empenho dá errado mesmo, TUDO! Já tenho anos de
experiências frustrantes pra saber que é só questão de tempo para que tudo seja
finalmente arruinado de vez e eu me perca em algum esquina da vida.
É animador, não acha?
A cada dia que passa estou sendo consumido pela minha
loucura e quando eu quase consigo sair de dentro da água para respirar, o peso
que me segura debaixo d’água aumenta...
A vida me odeia, nada mais...
Quem sabe eu deveria fazer como Medeia, personagem de
tragédia grega que mata os próprios filhos para que não lhes aconteça coisa
pior (uma mentira usada para persuadir o leitor/ouvinte quando ela apenas odeio
o marido e decide se vingar através dos filhos)... Tornar-me um assassino e me
livrar de meus filhos... Todos eles, objetos e seres vivos...
Tragédia!
Qual o sentido da vida?
Posso-lhe afirmar com certeza de que a minha não tem nenhum,
todos os que parecem estar diante de mim são destruídos a olhos vistos...
Bem, é isso, de volta a depressão... ou talvez ao ódio...
E a agora a total descrença de que realmente existem
milagres...
...
OBS.: Isso não é ficção, é realidade...