SONHOS III
Era véspera
de natal, ele chegou naquela casinha bem humilde com um pacote escondido atrás
das costas e chamou com um grito:
— Alguém em
casa?!
Uma senhora
baixinha, de cabelos desgrenhados, roupa suja por ter preparado o almoço,
atendeu ao senhor. Com olhar curioso, perguntou:
— O que
deseja?
— É aqui
que mora o menino?
— Sim
senhor, ele é um menino direito e não fez nada, eu juro!
— Por
favor, não me leve a mal, ele realmente não fez nada. Eu só gostaria de falar
com ele por alguns minutos, vou ser rápido.
Desconfiada,
a mulher manteve os olhos naquele estranho e chamou por seu filho:
— Menino! Venha
cá! Tem alguém que quer te ver!
O menino,
com uma camisa sem mangas desproporcional ao corpo magrelo, shorts acima dos
joelhos e chinelos de dedo nos pés com uns dez anos veio correndo, um pouco
hesitante de certo, com medo de ser uma bronca da velha mãe.
— Que foi
mãe? — Perguntou, com os olhos arregalados.
— Esse moço
disse que quer falar com você. Olha lá, hein?! Se você aprontou uma, vai levar
um pisa!
— Não mãe,
eu juro, eu não fiz nada! — Seus olhos ficaram úmidos, como se estivesse
sentindo as dores da última surra que levara por ter quebrado uma janela da
vizinha enquanto brincava.
— Por deus!
Não estou aqui para acusar ninguém! — Exclamou o sujeito preocupado.
Encarando o
silêncio, ele respirou fundo, relembrando o que precisava dizer e continuou:
— Você que
é o menino?
— Sou eu,
mas eu não te conheço senhor.
— Hahah,
não, você não me conhece. Poderia vir até aqui?
O menino
obedeceu, sentindo-se confuso e curioso ao mesmo tempo.
— Foi você
que mandou... — e tirou do bolso um papel dobrado. — ...esta cartinha pro Papai
Noel?
A mulher
ficou intrigada:
— Menino! E
você ainda acredita nessas besteiras?! Papei Noel não existe!
A criança,
sem dar ouvidos às descrenças da mãe, afirmou balançando a cabeça. O moço
prosseguiu:
— Você
disse que neste natal você queria duas coisas. Bem, uma delas está aqui... — e
mostrou o pacote. — Vamos, abra!
Rasgou o
embrulho com os dentes de tão ansioso. Seus olhos brilharam com a redonda
surpresa:
— Uma bola!
O homem
sorriu:
— Você
disse que a bola que você brinca com seus amigos não era uma bola de verdade,
uma bola de pano que não pula direito. Pois bem, Papai Noel me mandou te trazer
a sua bola!
Com certa
dificuldade, o garotinho tentou algumas embaixadinhas:
— Viu mãe!
Papai Noel existe!
— Valha-me
Deus! — disse com surpresa, sentindo-se constrangida por ter pensado daquela
forma. — Agradeça ao moço filho.
— Obrigado
moço — seu sorriso de satisfação cheio de dentes era imenso.
— De nada
menino. Sabe, precisamos de mais pessoas que acreditem nesse país, no futuro,
que coisas boas podem acontecer — colocando a mão na cabeça do garoto,
aconselhou. — Nunca deixe de acreditar! Mesmo que não seja o Papai Noel que
venha entregar o seu presente!
— Pode
deixar! — O menino correu para perto da mãe. — Olha mãe!
— Tô vendo filho — meio chorosa, a mulher
se aproximou da porta e conversou baixinho, deixando o filho brincar com a bola
nova. — Obrigada, moço. Meu menino queria muito ganhar uma bola nova e eu não
sabia o que fazer. Meu marido está preso, acabou se envolvendo com os traficantes
e foi levado pra cadeia. Eu não acreditava mais no Natal, mas o senhor foi mandado
por Deus pra trazer esse presente pro meu menino.
O homem
desconversou, um pouco acanhado, havia mais para dizer:
— Bem, o
seu filho não é o único que merece ganhar presente...
— Ué? Mas
eu não mandei nenhuma carta pro Papai Noel...
— Heheh,
não precisou. Veja com seus próprios olhos — ele virou-se para trás e gritou
para alguém no carro. — Pode vir!
— Não pode
ser...
Do carro
daquele senhor, saiu o marido da senhora. Ela não o via há meses e chegou a
pensar que algo ruim acontecera a ele na cadeia. Com tanta gente ruim reunida
no mesmo lugar, a possibilidade de um homem pobre conseguir sobreviver ileso
era muito pouca. Pessoas humildes como eles, por mais que continuem vivendo, se
conformam com o que não podem mais ter.
— Filho, é
o seu pai! Seu pai voltou!
— O quê?
Papai voltou? — a bola caiu no chão enquanto o menino saiu correndo.
Os três se
abraçaram entre felicidade e lágrimas, não havia palavras para descrever a
emoção daquele reencontro familiar.
O pai do
menino olhou para o senhor que tornou tudo possível:
— Como
posso agradecer?
O moço
sorriu:
— Não falte
ao trabalho, você começa segunda-feira depois do ano novo. Até lá, aproveite
pra ficar com a família. E não precisa dizer mais nada, espero que esse natal
seja o melhor todos!
— Será...
Prometo, pela minha esposa e pelo meu filho que será o melhor natal de todos.
— Hahah,
assim espero!
O menino
parou um instante, pegou a bola e a entregou ao senhor que a lhe dera:
— Toma, é
pra você... Tudo o que eu mais queria era que meu pai voltasse, não preciso
mais da bola.
— Você é
realmente um garoto muito especial — ele se ajoelhou para ficar na mesma altura
que o menino. — Me faça um favor... — O garoto olhou com atenção. — Guarde ela
pra mim? Ah! E não se esqueça de brincar muito, mas muito mesmo com ela!
— Eu...
posso?
— Claro! —
E devolveu a bola. — Bem, eu preciso ir. Tenham um feliz natal!
— Ah, mas
já?!
— Hahah, eu
preciso ir, tenho meu próprio natal para cuidar.
Sem mais, o
senhor voltou ao carro e o motorista começou a dirigir. Ali, seu filho adotivo
o esperava:
— Pra quê
tudo isso pai?
— Pelo
mesmo motivo que adotei você, oras! — riu-se um pouquinho.
— Mas ter
procurado saber quem era o pai do menino, pagar a fiança, dar um trabalho a ele
e ainda presenciar essa cena toda? Não saiu um pouco caro ou exagerado demais?
— Talvez...
Mas valeu a pena, uma família a mais acredita no futuro agora, não há nada
melhor que isso. Aliás... — ele tirou um pacote de uma bolsa escondida no
porta-malas. — Isso é pra você, feliz natal.
— Eu não
pedi nada... — e desembrulhou o pacote que continha dois livros. — “Crônicas
dos Senhores de Castelo” e “O Alquimista”?
— Você pode
não perceber o significado a princípio, mas quando chegar o momento certo, eles
se revelarão melhores do que você pode imaginar!
— Ahn...
Pai?
— Sim?
— Lê pra
mim?
— Hahaha,
claro!
Aquele foi
um natal perfeito...
...
Uma palavrinha do autor...
A situação desta história pode ser exagerada, no entanto, os Correios convidam há mais de 20 anos que pessoas comuns façam o papel de Papai Noel para diversas crianças que escrevem suas cartinhas ao bom velhinho. Gostaria de participar?
Para mais informações, acesse:
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Página oficial: http://blog.correios.com.br/papainoeldoscorreios/
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